Candangos, Di Cavalcanti, 1960

A alma brasileira na arte de Di Cavalcanti

Festas populares, favelas e operários são alguns dos temas presentes na obra de um dos artistas que mais representam a realidade brasileira: Di Cavalcanti. Em sua criação artística, conciliou a influência das vanguardas europeias com a elaboração de uma linguagem própria, com destaque para uma vertente social e nacionalista que realça temáticas ligadas ao cotidiano do povo.

Mais do que um grande pintor, Di Cavalcanti também foi ilustrador, caricaturista, gravador, muralista, jornalista, escritor e cenógrafo. Além disso, foi um dos idealizadores da Semana de Arte Moderna de 1922, para a qual criou o catálogo e o cartaz de divulgação e expôs doze de suas obras.

O artista ainda escreveu dois livros de memórias: Viagem da minha vida (1955) e Reminiscências líricas de um perfeito carioca (1964). Hoje suas telas podem ser vistas em diversos museus do Brasil e do mundo.

Nasce um artista brasileiro

Emiliano Augusto Cavalcanti de Albuquerque e Melo nasceu no dia 6 de setembro de 1897, na cidade do Rio de Janeiro. Seu pai era membro de uma tradicional família pernambucana e, por parte de mãe, Di era sobrinho do abolicionista José Carlos do Patrocínio. Ainda na infância conviveu com intelectuais como Joaquim Nabuco, Olavo Bilac e Machado de Assis.

Aos 17 anos de idade publicou sua primeira caricatura na revista Fon-Fon, conhecida por suas charges sociais e de cunho político. Dois anos depois mudou-se para São Paulo, onde realizou sua primeira exposição individual de caricaturas.

Nessa mesma época, começou a estudar na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, que logo abandonou, e produziu ilustrações para a revista O Pirralho. Como se vê, o reconhecimento pela sua arte chegou cedo.

Sua aproximação dos círculos modernos paulistas o incentivou a retomar a pintura. Suas primeiras obras retratavam personagens misteriosas e mulheres, muitas vezes em um ambiente de penumbra. Alguns exemplos dessa fase são “Figura” (1920) e “Mulher em Pé” (c. 1920).

Di retratou a sensualidade tropical brasileira

Em homenagem à prima Dida, assinou suas primeiras obras como Didi Cavalcanti, mas logo simplificou para Di Cavalcanti.

Foi amigo de inúmeros intelectuais de sua época, o que contribuiu para ampliar o interesse por sua arte e sua autuação em movimentos culturais. Sua rede de relações em São Paulo era ampla, formada por personalidades de peso como Mário de Andrade, Oswald de Andrade e Guilherme de Almeida.

Di Cavalcanti foi um dos idealizadores da Semana de Arte Moderna de 1922, ao lado de artistas como Anita Malfatti, Tarsila do Amaral, Victor Brecheret e Menotti del Picchia. No ano seguinte ao evento, viajou para Paris, onde estabeleceu contato com vários pintores contemporâneos como Pablo Picasso, Georges Braque, Fernand Léger e Henri Matisse.

Essa passagem pela França, trouxe influências para sua obra, em especial das vanguardas europeias. Essas influências o levaram a desenvolver uma linguagem própria, adotando uma temática nacionalista, com preocupações sociais.

Essas características podem ser observadas em “Samba” (1925), considerada a obra prima do artista. A tela traz a representação de uma mulher negra seminua que, ao lado do samba, foram temáticas que aparecem em vários de seus quadros. Essa pintura tem quase o mesmo reconhecimento que “Abaporu” (1928), de Tarsila do Amaral.

Samba, Di Cavalcanti, 1925
Samba, Di Cavalcanti, 1925

Outras telas de destaque são: “Scène Brésilienne” (1937/1938), “Três Raças” (1941), “Favela” (1958), “Carnaval no Morro” (1963” e “Baile Popular” (1972).

Scène Brésilienne, Di Cavalcanti, 1937-38
Scène Brésilienne, Di Cavalcanti, 1937-38
Favela, Di Cavalcanti, 1958
Favela, Di Cavalcanti, 1958
Carnaval no Morro, Di Cavalcanti, 1963
Carnaval no Morro, Di Cavalcanti, 1963
Baile Popular, Di Cavalcanti, 1972
Baile Popular, Di Cavalcanti, 1972

Artes diversas

Outro legado de sua carreira foi o fato de ter pintado os primeiros painéis modernos do Brasil, no Teatro João Caetano, no Rio de Janeiro.

Outros exemplares dessa arte são: o painel do Hotel Jaraguá (1954), em São Paulo, que homenageia a imprensa; o painel em mosaico de vidro no Edifício Triângulo, projetado por Oscar Niemeyer, que retrata os trabalhadores do café; e o painel Candangos (1960), instalado na Câmara dos Deputados, em Brasília.

Hotel Jaraguá, Di Cavalcanti, 1954
Hotel Jaraguá, Di Cavalcanti, 1954
Edificio Triangulo, Di_Cavalcanti
Edificio Triangulo, Di_Cavalcanti
Candangos, Di Cavalcanti, 1960
Candangos, Di Cavalcanti, 1960

Di Cavalcanti também ilustrou livros de Oscar Wilde, Álvaro de Azevedo, Jorge Amado, Monteiro Lobato, Mário de Andrade e Vinícius de Moraes.

É possível encontrar trabalhos seus em museus e coleções particulares por toda a América Latina, Estados Unidos e Europa. Seu ateliê e obra inacabada foram doados ao Museu de Arte Moderna de São Paulo, onde permanecem ainda hoje.

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André Dorigo

Doutor em História da Arte pela UFRJ. Desde 2017 tem cursos on-line sobre o tema e produz conteúdo para a internet, tendo milhares de alunos. Organiza viagens culturais em diversas cidades.

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