Quem já viveu a experiência de interagir com uma obra de arte? No Brasil, artistas como Hélio Oiticica eram mestres em criar experimentos artísticos que possibilitavam a participação direta do espectador.
Essa era uma forma de os artistas colocarem em questão o relacionamento entre arte e público, além de usarem a arte como forma de protesto político e de transgressão cultural.
Inicialmente adepto do Concretismo, Oiticica foi um dos criadores do movimento Neoconcreto, que via a obra de arte como um organismo vivo, que devia extrapolar os limites do quadro e se estender ao ambiente.
Artista performático, pintor e escultor, Oiticica sempre buscou forte experimentalismo e inventividade em suas obras, que geralmente eram acompanhadas de textos, comentários e poemas.
Formação baseada na livre criação e na experimentação
Hélio Oiticica nasceu no dia 26 de julho de 1937, no Rio de Janeiro. Até os 10 anos de idade foi educado pelos pais, sem frequentar escolas. Em 1954, ao retornar para o país após viver um período com a família no Estados Unidos, iniciou estudos na escola de Paulo Valter, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro.
Desde o início, sua formação foi marcada pela ênfase na livre criação e na experimentação. Um marco não menos importante em sua trajetória foi seu envolvimento com grupos artísticos, com os quais participou de diversas exposições. Entre 1955 e 1956, integrou o Grupo Frente, formado por artistas concretos. A partir de 1959, participou do Grupo Neoconcreto, ao lado de artistas como Lygia Clark e Lygia Pape, e, em seguida, da Nova Objetividade Brasileira.
Todo esse círculo de relações e experimentações artísticas levaram Oiticica a estabelecer o corpo como a centralidade de suas obras (funcionando como uma espécie de motor), em um contexto que reunia arte, vida, cotidiano e a rua. É nesse universo criativo que o espectador devia circular, de forma a vivenciar o espaço.
Oiticica traz arte para o espaço
Um dos primeiros trabalhos realizados por Oiticica foi a série “Metaesquemas” (1956-58). São mais de 400 pinturas, em pequeno formato, realizadas em guache sobre cartão, onde o artista fez experimentações com cores, formas abstratas geométricas e com o espaço.
É em 1959 que Oiticica inicia seu processo de transição da tela para o espaço ambiental. A instalação “Bilaterais” (1959) é um dos primeiros trabalhos que realçam essa mudança. Nela, vemos objetos coloridos suspensos por fios invisíveis que trazem forma e cor para o espaço.
A cor também é um elemento central na série “Penetráveis” (1960). O público é convidado a entrar em cabines que têm o ambiente dominado por uma cor. Assim, o espectador tem a experiência de vivenciar essa mesma cor. Já em “Grande Núcleo” (1960) o espectador vivencia o espaço ao caminhar entre placas amarelas presas ao teto por fios, onde pode criar suas próprias cabines.
E quem já não ouviu falar dos “Parangolés”? Espécie de capa que revela suas cores e texturas a partir do movimento corporal de quem o veste. Nesse trabalho, Oiticica continua estudando a relação das cores com o espaço, incluindo o corpo como suporte.
A inovação foi fruto da aproximação do artista com a escola de samba Estação Primeira de Mangueira. Em suas visitas à escola, visualizou como poderia incorporar ao seu trabalho as relações corporais oriundas da dança e do ritmo.
Em suas inúmeras aparições públicas, os parangolés foram vestidos por moradores e dançarinos da Mangueira, Caetano Veloso (Parangolé P04, capa 01, de 1968) e pelo ator Luiz Fernando Guimarães (Parangolé P30, capa 23, de 1965-72).
Arte que inspira
As obras de Hélio Oiticica marcaram e transcenderam seu tempo. “Tropicália” (1967), por exemplo, foi uma instalação montada na exposição “Nova Objetividade Brasileira”, realizada no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, que logo deu nome a um importante movimento da música brasileira.
A instalação foi composta por dois Penetráveis com plantas, areias, poemas-objetos, capas de parangolés e um aparelho de TV – formando uma espécie de labirinto sem teto que remetia à arquitetura das favelas. A obra é vista como um fruto de todas as vivências e pesquisas realizadas pelo artista (realçando o caráter de brasilidade).
Um exemplo da arte de Oiticica que pode ser apreciado de perto é a instalação “Magic Square” (1977), no Instituto Inhotim, em Minas Gerais. Ela foi concebida para que o público possa ter uma experiência imaginativa, criando seu próprio espaço com base nas formas e cores dispostas por Oiticica.